Situada às portas de Belmonte, a Torre de Centum Cellas é um dos monumentos mais intrigantes da paisagem arqueológica portuguesa.
A sua forma imponente e as origens pouco claras alimentam um misto de fascínio e especulação, tornando-a numa peça singular do património romano na Península Ibérica.
A estrutura, em granito, apresenta uma planta retangular de cerca de 11,5 por 8,5 metros e eleva-se até aos 12 metros de altura.
Apesar de desprovida da cobertura original, mantém uma presença marcante na paisagem, com vãos, aberturas e compartimentos que têm alimentado várias hipóteses ao longo dos séculos.
Já se falou de uma torre de vigia, prisão romana ou mesmo de ligações a civilizações longínquas – teorias que hoje se consideram infundadas.
Investigadores como Helena Frade ajudaram a clarificar a sua origem: a torre terá feito parte de uma villa romana do século I d.C., pertencente a um abastado comerciante de estanho, Lucius Caecilius, nome que surge associado à inscrição “Centum Cellas”.
Em redor da torre, escavações revelaram vestígios de armazéns, áreas de habitação, e o que se pensa terem sido termas e alojamentos para escravos, entretanto perdidos com o tempo.
O piso térreo seria usado para armazenar produtos, enquanto o andar superior abrigaria uma sala nobre, rodeada por uma varanda coberta sustentada por colunas toscanas. Com telhado de duas águas e frontões triangulares, a construção destacava-se pela robustez e equilíbrio estético.
Durante a Idade Média, a torre foi reaproveitada, tendo-lhe sido acrescentado um terceiro piso. No século XII, a localidade que a rodeava chegou a receber foral de D. Sancho I, com o nome de Centuncelli, antes de a sede do concelho ser transferida para Belmonte.
Supõe-se que a torre desempenhou um papel defensivo relevante na linha de fronteira com o Reino de Leão.
À componente histórica junta-se um vasto conjunto de lendas. Uma das mais difundidas afirma que a torre teria sido prisão de São Cornélio, cuja morte ali teria ocorrido por volta de 253 d.C.
Outras histórias falam de cem celas misteriosas, mulheres com crianças às costas ou até de um bezerro de ouro escondido nos seus alicerces.
O que se sabe com mais certeza é que a torre sofreu um incêndio no século III, que terá levado a alterações em algumas partes da estrutura.
Uma pequena capela dedicada a São Cornélio foi construída já em época medieval, cujas fundações ainda são visíveis.
A Torre de Centum Cellas continua a resistir ao tempo. É hoje um local de visita obrigatória para quem percorre a região da Beira Interior, não só pela sua importância histórica, mas também pela paisagem que a envolve – e pelos segredos que, talvez, ainda guarde.










