Antes de os romanos chegarem e muito antes de os lusitanos ganharem protagonismo, o território hoje conhecido como Portugal tinha outro nome: Ofiússa. É assim que os gregos se referiam à “terra das serpentes”, habitada por um povo celta vindo da Europa Central – os Ofis, também conhecidos como Sefes.
Oriundos da região germano-checa, integravam a cultura de Hallstatt, associada aos primeiros celtas da Idade do Ferro. De acordo com a Celtic Encyclopedia, terão atravessado os Pirenéus por volta de 900 a.C., acompanhados pelos Cempsos, outra tribo celta que se estabeleceu mais a sul, na zona do atual Algarve.
Marcas da chegada
A chegada dos Ofis provocou mudanças visíveis no padrão de povoamento, sobretudo no Alentejo. A arqueologia regista o desaparecimento súbito de antigos povoados nas margens do Guadiana e na Serra de Huelva, substituídos por novos assentamentos em áreas elevadas — um sinal de reorganização social e possível instabilidade militar.
As fontes clássicas, como o poema Ora Marítima, de Avieno, situam os Ofis entre a foz do Tejo e do Sado, embora haja indícios de que se terão expandido para o Norte, até à Galiza.
Vários topónimos atuais revelam a sua passagem: Dipo (Evoramonte), Beuipo (Alcácer do Sal), Olisipo (Lisboa) e Colipo (Leiria). O sufixo “-ipo”, recorrente nestas denominações, é apontado como uma marca linguística característica das fundações ofis.
Um povo sem escrita, mas não sem história
Os Ofis substituíram os Estrímnios, povo pré-celta que vivia disperso e sem organização política ou registo escrito. A sua cultura era predominantemente oral, o que dificulta hoje a reconstrução do seu modo de vida. A presença dos Ofis, mais estruturada e com práticas celtas bem definidas, marcou uma viragem na ocupação do território.
Não há registos diretos sobre os costumes específicos dos Ofis, mas, por analogia com a cultura de Hallstatt, é possível delinear alguns traços prováveis: aldeias fortificadas, casas de madeira e colmo, economia baseada na agricultura, pecuária e metalurgia, e uma estrutura social dominada por uma elite guerreira.
Crenças, rituais e símbolos
A religião dos celtas da cultura de Hallstatt tinha uma forte ligação à natureza. Rituais religiosos eram celebrados em bosques ou fontes, e as divindades estavam associadas à guerra, fertilidade e ciclos naturais.
A serpente, animal venerado pelos Ofis, simbolizava sabedoria e poder — e terá estado na origem do nome grego atribuído ao território: Ofiússa.
Não é claro o que terá acontecido aos Ofis. A ausência de uma escrita própria impede uma resposta definitiva, mas pensa-se que terão sido assimilados por outras tribos celtas, incluindo os lusitanos.
Há mesmo quem defenda que os lusitanos resultaram da fusão entre os Estrímnios, os Ofis e outros grupos vindos da Europa Central.
Um contributo silencioso
Apesar da escassez de dados, os Ofis deixaram marcas — algumas visíveis, outras subtis. A toponímia, os vestígios arqueológicos e certos traços da cultura popular sugerem que a sua presença teve um impacto duradouro, mesmo que hoje seja pouco conhecida.
Num território onde muitos povos deixaram rasto, os Ofis destacam-se por aquilo que representaram: uma das primeiras ondas organizadas de ocupação celta, com influência na estrutura social, nos centros urbanos e, talvez, até na identidade coletiva que se viria a formar séculos mais tarde.










