Muito antes de o nome “Portugal” ecoar pelos oceanos, a ilha mais pequena dos Açores já guardava um segredo.
Quando os navegadores portugueses se aproximaram da Ilha do Corvo, no século XV, vindos do noroeste, foram surpreendidos por algo invulgar: no alto de um penhasco erguia-se a figura de um homem a cavalo, talhado em pedra.
A escultura — de dimensões notáveis — mostrava um cavaleiro de olhar fixo no horizonte, com o braço estendido e o indicador apontado a ocidente, como que a indicar um caminho por explorar.
Sobre a pedra que lhe servia de base, lia-se ainda, embora desgastada pelo tempo e pelo mar, a inscrição: “Jesus, avante!”. Uma espécie de apelo simbólico aos descobridores para seguirem rumo ao desconhecido.
De onde veio esta estátua?
Não se sabe quem a colocou ali. Algumas teorias atribuem-na aos cartagineses ou aos seus antecessores fenícios, povos antigos com reconhecida capacidade de navegação no Atlântico.
As viagens de exploradores como Hanno e Himilco, referidas por autores clássicos, indicam que estes navegadores já frequentavam zonas costeiras bem distantes do Mediterrâneo. E há provas de presença cartaginesa em locais como Mogador, na costa atlântica de África.
A presença de moedas púnicas encontradas no Corvo, bem como relatos históricos e representações equestres comuns nas culturas do Mediterrâneo, alimentam a hipótese de que a ilha poderia ter sido conhecida muito antes da chegada dos portugueses. No entanto, nenhuma prova arqueológica foi ainda conclusiva.
O desaparecimento e a persistência do mito
Durante o reinado de D. Manuel I, terá sido enviada uma expedição para remover a estátua e transportá-la para o reino. O plano correu mal e a escultura partiu-se em pedaços, dos quais alguns teriam sido levados para Lisboa.
Hoje, apenas resta a memória — e o promontório a noroeste da ilha, que guarda o nome original do local: ilha do Marco.
Apesar da sua provável origem lendária, a história da estátua do Corvo continua a fascinar. Em 1983, escavações lideradas por B. Isserlin, da Universidade de Leeds, revelaram fragmentos de cerâmica invulgar. A datação não foi conclusiva, mas voltou a alimentar o debate.
Mais tarde, o escritor Gavin Menzies aventou a teoria — sem provas — de que a estátua teria sido obra de navegadores chineses no século XIV. Hipótese que permanece no campo da especulação.
Para lá do mito
A história da estátua equestre da Ilha do Corvo pode não resistir a uma análise histórica rigorosa, mas resiste como símbolo.
Num tempo em que se revê criticamente o mito da primazia portuguesa nas ilhas atlânticas, torna-se cada vez mais importante estudar com abertura e cuidado a pré-história dos Açores e de toda a Macaronésia.
A estátua desapareceu. O mistério, esse, permanece. E continua a inspirar quem se aventura a estudar o passado mais remoto das ilhas portuguesas.











Cartaginesa ou chinesa e a dizer, em português decerto, “Jesus, avante”! Que historinha…