A dois quilómetros de Viana do Alentejo, no meio da planície onde o tempo parece abrandar, ergue-se um dos templos mais marcantes do sul do país. O Santuário de Nossa Senhora de Aires é, para muitos, o centro espiritual do Alentejo.
E não é difícil perceber porquê. A grandiosidade da fachada contrasta com a envolvência rural, e o silêncio da paisagem reforça a aura de recolhimento e mistério que envolve o local.
Apesar de isolado, o santuário tem uma longa história de romarias e promessas cumpridas. Desde a Idade Média que ali se reúnem peregrinos de toda a região, mas as origens do culto são muito anteriores.
Há quem aponte este lugar como um antigo povoado celta, e os vestígios romanos e visigóticos encontrados nas redondezas ajudam a reforçar essa ideia. Algumas dessas pedras antigas — com inscrições em latim — foram reaproveitadas na construção do templo, dando origem a lendas que ainda hoje se contam.
Uma das mais conhecidas fala de um lavrador que, ao lavrar o campo, encontrou uma pequena imagem escondida num pote de barro.
Essa mesma imagem estaria na origem do culto mariano que ali ganhou força, ao ponto de o próprio D. Dinis, em 1312, ter ordenado a reconstrução do templo depois de ter sido destruído pelos mouros.
Mas foi no século XVIII que o Santuário de Nossa Senhora de Aires conheceu a sua época de ouro. Em 1748, uma epidemia de peste assolou a região.
Os comerciantes locais prometeram uma grande festa caso o surto cessasse — e cumpriram. A festividade durou três dias e ainda hoje se repete todos os anos em setembro, mantendo viva a ligação entre fé e comunidade.
Foi essa mesma devoção que levou à transformação da pequena ermida original numa igreja maior, e depois num santuário imponente, cuja construção ficou concluída em 1804.
O edifício, em estilo rococó, mantém a sobriedade do Alentejo: paredes brancas, faixas amarelas, linhas simples, sem excessos. No entanto, a elegância do conjunto e a harmonia com a paisagem envolvente conferem-lhe um charme inegável.
Por dentro, o templo surpreende pela riqueza das peças religiosas e pelas paredes cobertas de ex-votos — pequenos quadros, objectos e pinturas que contam histórias de fé, gratidão ou pedidos silenciosos. O resultado é um dos mais curiosos testemunhos de arte popular do país.
Além da festa de setembro, destaca-se também a romaria a cavalo, que parte todos os anos da Moita, no Ribatejo, em direção a Viana do Alentejo. São cerca de 120 quilómetros de caminho em terra batida, por entre quintas e montes, num percurso que resgata as tradições da lavoura.
A peregrinação teve início com lavradores que levavam os seus animais ao santuário para serem benzidos, pedindo proteção para as colheitas — já que Nossa Senhora de Aires é considerada padroeira da agricultura e dos animais.
A visita ao santuário pode facilmente ser combinada com outros pontos de interesse nas redondezas. Viana do Alentejo fica ali ao lado, mas também vale a pena explorar locais como Alvito, Portel, Vidigueira, Cuba ou mesmo Évora, que está a pouco mais de meia hora.
E, se houver tempo, a pequena vila do Torrão, com as suas ruas tranquilas e autenticidade alentejana, é uma paragem que compensa.
Em qualquer época do ano, o Santuário de Nossa Senhora de Aires é um convite à pausa, à descoberta e ao silêncio. Um lugar onde a história, a fé e o território se cruzam — e onde o Alentejo revela a sua face mais genuína.










