No topo da Serra da Lousã, há uma aldeia de xisto que quase desapareceu. Restam as casas, os muros antigos, os vestígios de uma comunidade outrora unida — e um único habitante.
Aigra Velha pertence ao concelho de Góis e é a mais isolada das Aldeias do Xisto da região. Para lá chegar é preciso seguir por estradas estreitas, entre encostas densas e caminhos que parecem ter parado no tempo.
Quando se chega, o cenário é desarmante: uma única rua, um conjunto de casas de xisto, algumas restauradas para turismo rural, e um silêncio que pesa.
Hoje vive aqui apenas uma pessoa. Trabalha a terra, presta pequenos serviços nas aldeias vizinhas e permanece como guardião solitário de uma memória colectiva que vai resistindo como pode.
Mas nem sempre foi assim. Aigra Velha teve em tempos vida própria, com famílias que ali se fixaram para trabalhar na agricultura e no pastoreio.
A aldeia desenvolveu uma arquitectura peculiar: as casas estão interligadas por muros de xisto, construídos como barreira contra três ameaças: o clima rigoroso da serra, os lobos e os forasteiros. Os lobos já não andam por ali, mas o isolamento mantém-se.
A meio do século XX, como tantas outras povoações do interior, Aigra Velha foi esvaziando. A emigração levou quase todos. Ficaram as ruínas e, mais tarde, as tentativas de recuperação, com algumas casas transformadas em alojamentos para quem procura sossego e paisagem.
No centro da aldeia, há um forno e um alambique comunitário recuperados. Aqui ainda se faz broa e aguardente — vestígios de um quotidiano agrícola que persiste, embora já quase só como demonstração.
A visita a Aigra Velha pode ser feita a pé, num percurso que integra a Rota das Tradições do Xisto, com 9,2 quilómetros e passagem pelas quatro aldeias do concelho: Aigra Velha, Aigra Nova, Pena e Comareira. Esta última tem também apenas um habitante. Três aldeias, três pessoas. Um retrato preocupante do despovoamento do interior português.
A paisagem é deslumbrante. Há penedos imponentes, quedas de água, e a Mata da Oitava — 470 hectares incluídos na Rede Natura 2000, com espécies autóctones como o medronheiro, o castanheiro e o azevinho.
Há também percursos para geocaching, pensados para atrair um turismo mais activo e atento.
Mas o contraste entre o esforço de valorização turística e o esvaziamento populacional levanta questões. Pode uma aldeia sobreviver com um único residente? E durante quanto tempo?
Aigra Velha é um símbolo. Não apenas de um modo de vida que se perdeu, mas também do abandono progressivo de zonas inteiras do país. Um Portugal que poucos conhecem, que resiste entre pedras e silêncio, à margem dos mapas e das estatísticas.










