Nem sempre é fácil compreender os motivos que levam um cão a simpatizar de imediato com uma pessoa… e a desconfiar de outra.
Mas esta reação instintiva, tantas vezes atribuída ao “sexto sentido canino”, tem explicações bastante concretas – e muitas delas estão relacionadas com o olfato, a memória e a forma como os cães percebem o mundo à sua volta.
Muito mais do que faro
Com cerca de 220 milhões de receptores olfativos (em comparação com os nossos cinco milhões), os cães captam cheiros de forma impressionante. Mas mais do que detectar odores, são capazes de os associar a experiências passadas.
Um aroma pode recordar um momento de carinho… ou um episódio traumático. Não é raro que um cão evite uma pessoa que lhe recorde, por exemplo, alguém que lhe fez mal — mesmo que esta nunca lhe tenha feito nada diretamente.
O odor das emoções
Os cães também conseguem perceber variações químicas no corpo humano. O suor, os feromonas e até a adrenalina libertada em momentos de stress são sinais interpretados por eles. Um estudo revelou que os cães expostos ao cheiro de pessoas assustadas tornavam-se mais cautelosos e hesitantes.
Não se trata de “julgar o carácter”, mas sim de detectar reações emocionais através do olfato – uma capacidade essencial, por exemplo, no trabalho de apoio a pessoas com perturbações de ansiedade ou stress pós-traumático.
Experiências que deixam marca
Para além da química, há ainda fatores emocionais e sociais. Um cão que tenha sofrido maus-tratos por parte de alguém com uma determinada aparência, tom de voz ou tipo de roupa, poderá reagir negativamente a outras pessoas semelhantes.
Por vezes, basta o cheiro a comida associada a uma má recordação – como o caso de cães que se mostram agressivos quando sentem o aroma de pizza, por remeter a um episódio de agressão cometido por um pizzaiolo.
Como conquistar a confiança de um cão desconfiado?
A boa notícia é que a maioria dos cães pode ser ensinada a ultrapassar esses receios. A chave está na paciência e no reforço positivo.
Deixar o cão aproximar-se ao seu ritmo, permitir-lhe cheirar com calma, evitar movimentos bruscos e oferecer petiscos em momentos tranquilos são estratégias eficazes para criar confiança.
Eis algumas dicas para ajudar na socialização:
- Exposição gradual: Apresentar novas pessoas em ambientes calmos e seguros.
- Reforço positivo: Premiar comportamentos tranquilos com petiscos ou palavras de incentivo.
- Troca de odores: Deixar que o cão cheire um objeto usado pela pessoa antes do encontro.
- Ambiente neutro: Evitar interações iniciais em espaços onde o cão se sinta ameaçado.
- Rotina e consistência: Repetir os encontros em contextos semelhantes pode reduzir a ansiedade.
E se parecer que o cão não gosta do próprio tutor?
É raro, mas possível. Um cão que evita o dono, ignora os seus chamados ou recusa carinho pode estar a sinalizar desconforto ou desconfiança.
Nestes casos, o mais importante é perceber se houve alguma mudança recente na relação, se o cão está doente ou se algo na rotina o está a perturbar. Um comportamento distante nem sempre é sinal de rejeição – pode ser apenas uma chamada de atenção.
Construir uma boa relação com um cão exige tempo, respeito e compreensão. Tal como conosco, a confiança não nasce num dia – mas, quando é conquistada, transforma-se num laço sólido e sincero.










