É preciso mais do que o código postal 1000 para entender verdadeiramente o falar típico dos bairros lisboetas.
A linguagem popular da capital tem vida própria, moldada por gerações que cresceram entre ruas estreitas, miradouros e pregões de mercado.
São expressões com sotaque e alma, algumas quase esquecidas, outras ainda vivas no dia a dia de quem sabe de onde vem.
Neste pequeno guia cabem 55 expressões populares que só um verdadeiro alfacinha – de gema, como se diz – compreenderá sem pestanejar.
Algumas nasceram nos bairros antigos, outras chegaram com as camionetas da Estremadura, outras ainda floresceram entre risos, partidas e rotinas citadinas.
A lista que se segue não pretende ser exaustiva, mas é um mergulho saboroso na linguagem informal de Lisboa. Um glossário que mistura humor, crítica social e muita criatividade.
Expressões do dia a dia lisboeta
- Afragatar-se – tentar seduzir alguém com segundas intenções
- Alpinar – fugir, escapar
- Alambiques – pés com mau cheiro
- Altamar – a margem do Tejo entre Cacilhas e Trafaria
- Bairro Bife – forma jocosa de se referir ao Bairro Alto
- Bate-sornas – ladrão de transeuntes adormecidos na rua
- Beateiro – quem anda à caça de beatas de cigarro
- Benzer – roubar
- Bibe – sobretudo ou gabardina
- Bidé – terra natal ou vila pequena
- Bilargo – travessa estreita
- Bordo – golpe de faca
- Botica do Xexé – sítio muito desorganizado
- Branca – lençol
- Broi / Broia – coisa boa
Calão, gíria e sons da cidade
- Calcas – botas
- Cantar a cigana – estar embriagado
- Carmoso – tostão (moeda antiga)
- Carrapata – ferida difícil de sarar
- Carreira – autocarro de passageiros (Estremadura)
- Burogaço – caruma (também Estremadura)
- Castiço – castelhano
- Cecear – falar com o S arrastado
- Chá-de-fora – carne entre a alcatra e o pojadouro
- Chão-grande – Terreiro do Paço
- Chibato – delator na prisão
- Corcar – torcer
- Cravo – vendedor de carvão
- Derrete – tentativa de galanteio
- Desorinado – desorientado
- De uma figa – pessoa essencial
- Embarcar – empurrar
- Engadanhado – com as mãos dormentes do frio
- Esbroncado – desconfiado
- Escanência – comida
- Estampilha – estalada ou bofetada
Utensílios, insultos e costumes
- Facha’vôr – faz favor
- Fraqueta – faca
- Gabedo / Gebaba – toque no chapéu
- Gaita – pénis
- Garchinho – garfo
- Lega – patroa
- Macavenco – pessoa excêntrica
- Malva – guarda-chuva
- Miomba – bife no pão
- Neta – água-pé
- Obras de Santa Engrácia – coisa que nunca mais acaba
- Palheta – pá do lixo
- Pandar – mexer nos bolsos alheios
- Panta – quem muda facilmente de opinião
- Pano de esfrega – a língua
- Pente – rapariga vistosa
- Pinóia – bom negócio
- Vianinha – pão pequeno e delicado
- Volta dos tristes – passeio típico de domingo de Lisboa a Sintra ou Cascais
Cada uma destas expressões conta uma história – ou várias. Umas nasceram na rua, outras nos cafés, muitas no convívio entre vizinhos.
Algumas soam antigas, outras mantêm-se vivas, ainda que discretas, no linguajar de um ou outro resistente da velha Lisboa.
Vale a pena guardar este dicionário informal, não só para compreender melhor a cidade, mas também para celebrar a sua criatividade linguística.










