Conhecido também pelos nomes de Torre de Coina ou Palácio da Bruxa, o Palácio do Rei do Lixo está situado na freguesia de Coina, no Barreiro, e é bem visível da estrada nacional nº10. O local presta-se ao mistério e às lendas urbanas, que perpetuaram no tempo e que ainda hoje não se sabe se têm ou não fundo de verdade. O que é certo é que a imponente torre chama à atenção e desperta a curiosidade e imaginação de quem a admira.
Inicialmente, a quinta onde se encontra o palácio foi uma propriedade rural, no séc. XVIII, de D. Joaquim de Pina Manique, irmão do intendente de D. Maria I, Diogo Inácio Pina Manique. Já no século XIX, a propriedade foi adquirida por Manuel Martins Gomes Júnior, comerciante de Santo António da Charneca, que aí mandou construir o palácio, “para conseguir avistar a propriedade que possuía em Alcácer do Sal”.
Manuel Gomes Júnior era conhecido como “Rei do Lixo”, uma vez que detinha o exclusivo de recolha de detritos da cidade de Lisboa, tendo feito uma fortuna a comprar e vender lixo. Era um homem de contradições. Um defensor dos pobres que queria ser milionário. Um bom patrão que foi injusto com alguns dos seus funcionários. Um crítico da corrupção que assolava Portugal que foi acusado de dar uma golpe numa companhia de seguros. Um republicano que se desiludiu com a sua amada República.

Ele foi isto e muito mais. E numa mistura de sorte com perícia, e de instinto com manha, construiu na margem sul do Tejo um edifício cujos adjetivos com que é catalogado podem bem ser os mesmos que os que caracterizam o homem que o pensou.
Conhecido por ser profundamente ateu, Manuel Gomes Júnior acabou por transformar a ermida em armazém e estábulo, tendo batizado a herdade de “Quinta do Inferno”. A propriedade acabaria por se tornar mais tarde uma importante casa agrícola, através do seu genro, António Zanolete Ramada Curto. A torre foi construída em 1910, sendo que em 1906 tinha aberto uma escola na sua quinta para oferecer educação gratuita aos seus empregados e filhos.
Já as suas fragatas, transformadas em arrastos do lixo, receberam nomes como Mafarrico, Mefistófeles, Demo, Diabo, Satanás, Belzebu, Horrífico, Caronte, Plutão e Averno, entre outros nomes que foram escolhidos para chocar a flora conservadora e católica.
Esta provocação ao regime eclesiástico secular, já de si ferido pela revolução do 5 de outubro, valeu-lhe a fama, que ainda hoje dura, de ser um homem ateu impenitente, de feitio irregular e pouco dado ao afeto.

Manuel Martins e a sua família nunca chegaram a habitar o palácio, já que as obras foram interrompidas em 1913-1914, estando o imóvel incompleto. No entanto, o facto de ter adquirido o local e lhe ter dado o seu aspeto imponente fez com que o nome da propriedade estivesse para sempre ligado a si.
Em 1957, a propriedade foi vendida a Joaquim Baptista Mota e António Baptista, dois grandes proprietários e industriais dos curtumes, que ali criaram a Sociedade Agrícola da Quinta de S. Vicente, transformando o local numa importante exploração pomícola.
Já na década de 70, a propriedade foi adquirida por António Xavier de Lima, conhecido construtor da margem sul do Tejo, que comprou toda a Quinta de S. Vicente e os terrenos adjacentes às quintas, tornando-se assim proprietário. Em 1988, ocorreu um incêndio de contornos misteriosos que veio contribuir para o estado degradado do palácio, na altura já desabitado há 18 anos.
O Palácio do Rei do Lixo pertence, hoje, vive na incerteza, à espera que alguém decida investir nele e aproveitar todo o seu potencial, seja turístico, industrial ou de habitação.