A língua portuguesa é o espelho de séculos de encontros, migrações e trocas culturais. No meio da herança deixada por romanos, árabes ou germânicos, há uma influência menos falada, mas ainda assim presente: a dos Celtas. Povos antigos da Europa Ocidental, deixaram marcas na paisagem, na história e… nas palavras.
Entre os séculos XII a.C. e I d.C., os Celtas espalharam-se por vastas regiões da Europa, incluindo o norte da Península Ibérica. Não formavam um império, mas sim uma rede de tribos com culturas e línguas aparentadas, as chamadas línguas célticas.
Quando o Império Romano se expandiu, estas tribos foram sendo absorvidas, mas não desapareceram sem deixar rasto – nem tudo se perdeu com o latim. Algumas palavras sobreviveram, atravessaram o tempo e chegaram até ao português moderno.
Abaixo estão doze exemplos de palavras com raízes célticas, incorporadas através do latim e ainda hoje em uso:
- Barra: originalmente designava o topo de uma árvore ou um penacho. Hoje é usada para tudo, de peças metálicas a regiões costeiras.
- Braga: além de nome de cidade e roupa íntima, deriva da palavra céltica bracca, usada para calças típicas da Gália.
- Cabana: simples abrigo ou casa modesta, vem de cappano, termo celta para tenda ou refúgio.
- Caminho: palavra que evoca deslocação, escolhas ou percursos de vida, com origem em camino, termo celta para “passagem”.
- Camisa: do celta camisā, peça de vestuário básica que sobreviveu aos séculos sem grandes mudanças de forma ou função.
- Gato: os celtas chamavam-lhe cattos, talvez por se referirem ao seu instinto caçador — traço ainda hoje reconhecido.
- Légua: antiga unidade de medida que vem de leukā, ligada ao conceito de distância percorrida sob a luz do dia.
- Manteiga: ligada a mantikā, que remete para bolsas de couro usadas na produção do alimento.
- Minhoca: diminutivo de origem celta que transmite ideia de pequenez e fragilidade: minnucā.
- Salmão: do celta salmā, “peixe saltador”, nome que faz justiça ao seu comportamento migratório.
- Tojo: planta espinhosa comum no campo português, com nome derivado de tolio, o “espinho” celta.
- Vassalo: designava originalmente um jovem ou criado. A palavra foi ganhando peso social até à Idade Média, onde assumiu um papel central na hierarquia feudal.
Uma herança discreta mas persistente
A herança celta no português é subtil – muitas vezes disfarçada sob o latim -, mas revela uma faceta fascinante da história da língua.
Ao descobrirmos estas raízes, ganhamos uma nova consciência do tempo e das culturas que moldaram o modo como falamos.
No fundo, cada palavra é um fragmento de uma história mais antiga do que imaginamos.
E a língua, esse corpo vivo que nos liga ao passado, continua a ecoar vozes de povos que já desapareceram… mas que ainda falam por nós.










